27 de maio de 2009

Filme-Flagelo

Todo mundo já assistiu algum filme desses em que nos angustiamos, nos contorcemos e somos destruídos a medida que os protagonistas (nossos heróis) trilham caminhos tortuosos que os levam à ruína absoluta. Ao término da sessão nos encontramos arruinados e, regra geral, proferimos a frase clássica: EU NUNCA MAIS QUERO VER ESSE FILME!

Mas a verdade é que a frase é mentirosa (ou não, como diria Caetano), ao menos em parte, pois embora o filme tenha significado um martírio, é impossível deixar de reconhecer seus méritos como obra de arte, sua beleza, poesia ou simplesmente originalidade.

Tenho um conceito para esse tipo de filme: é o que chamo de “filme-flagelo”.

No fim das contas ele vai acabar parando em nossas prateleiras de filmes, mesmo que não tenhamos a coragem para rever. Mas é quando um visitante fixa os olhos sobre aquele DVD que nós exclamamos: “Não acredito que você nunca viu esse filme!”. A frase funciona como uma deixa, uma artimanha para que possamos nos submeter novamente àquela obra (e de quebra ainda termos o prazer um tanto sádico de analisar as reações do pobre diabo que serviu de desculpa para o nosso desejo reprimido de reviver a malfadada experiência).

Há três exemplos que encaro como clássicos do gênero (e que se encontram na minha estante, é claro!). Eu os classifico da seguinte forma:


Dançando no Escuro
Nível de angústia: Máximo!!!

Desavisados podem entrar em coma ou tentar cortar os pulsos após uma sessão desta obra de Lars Von Trier. Há risco de desidratação, pois é absolutamente impossível não se desmanchar em lágrimas, soluços e às vezes gritos de revolta. Impossível não se surpreender com a atuação da Bjork (e não chegar à conclusão de que ela é mesmo de outro planeta). Quase impossível conter o impulso de participar dos belos números musicais (lindos, criativos, estranhos e angustiantes). É pouco provável que ao final alguém queira rever o filme, e menos provável ainda que alguém não sente para rever um número musical que seja (no meu caso é sempre o do trem!).


Réquiem para um Sonho
Nível de angústia: Exemplar.

A forma mais segura de assistir à obra de Darren Aronofsky é embrulhar-se em uma camisa de força. Uma ode à autodestruição pelo vício (todas as formas de vício possíveis). O rítmo é frenético, videoclipado e melodramático (literalmente, pois a música acompanha toda a construção do clima e amplifica o efeito massacrante do drama). Ao final da projeção, a desesperança: não resta espaço para um fio sequer de esperança, em nada, nem para ninguém. Mas está mentindo quem diz que não sente uma agitação ou não se sente instigado ao ouvir os acordes da magnífica trilha sonora.


Meninos não Choram
Nível de angústia: Suficiente...

Em poucas palavras: Triste. Trágico ao extremo. Hillary Swank arrasa. A clássica música do “The Cure” toca nos créditos, mas não cura coisa alguma, na verdade cutuca mais fundo a ferida já aberta.

Claro que há muitos outros exemplos do gênero, mas é preciso não confundir o trauma que significa assistir um filme-flagelo, com a melancolia ou a desilusão que resultam de outros gêneros mais comuns no mercado cinematográfico, que mesmo tristes, melancólicos ou trágicos (geralmente em seus desfechos) acabam se enquadrando em outras categorias que devo comentar em momento oportuno.

20 de maio de 2009

Lady Dior



A grife francesa Dior acaba de lançar uma campanha que homenageia o cinema noir. Em Lady Dior, a vencedora do Oscar de melhor atriz Marion Cotillard personifica uma dama audaciosa e independente envolvida em uma trama de suspense.

O curta é o primeiro de uma série de quatro partes que devem se passar em diferentes cidades. A primeira delas é Paris (e o clímax se passa na Torre Eiffel), claro!

É bem bacana quando moda e cinema dialogam, convergindo em trabalhos artísticos como esse. O efeito que surte daí tem maior apelo artístico que publicitário. É claro que resulta em alguma influencia sobre a imagem da marca, mas não se trata de mera publicidade. O objetivo principal não é vender bolsa, mas somar referências à imagem da marca.

Veja o trailer do filme aqui:



Leia mais a respeito em L'Officiel Brasil.
Confira o thriller completo no site da Dior.

13 de maio de 2009

O NEVOEIRO (The Mist,2008)


Frank Darabont tem um gosto especial por obras de Stephen King. Mas até então suas adaptações do autor para o cinema estavam centradas em dramas, como os excelentes “Um Sonho de Liberdade” (1994) e “À Espera de Um Milagre” (1999).

É notório que Stephen King se destaca na literatura de horror justamente pela forma como delineia o perfil psicológico de seus personagens, fazendo com que o leitor seja capaz de compreender seu comportamento e reações diante das situações mais fantásticas (e implausíveis).

Em “The Mist” o diretor se utiliza dessa característica ao adaptar o conto de uma forma realista (mesmo com boa dose de absurdo, lugar comum nas obras de King), porém bastante densa, profunda e apavorante.

Sem rodeios, em quinze minutos o filme apresenta a situação à qual os personagens, e por tabela os espectadores, estarão sujeitos: o horror. Mas aos poucos o fantástico cede espaço para o estudo de comportamento e a análise sobre ética, religião, autoridade e, sobretudo, o desespero.

O pôster diz: “Fear changes everything” (O medo muda tudo). Exatamente o que se demonstra com brilhantismo e crueza, durante a trama. Especialmente no final (não se preocupe, não vou contar!), irônico, amargo e extremamente corajoso. Espectadores descrentes se perguntam se tudo aconteceu ou se não poderia ser apenas um sonho, um pesadelo absurdo e cruel. Mas está tudo ali na tela, não há alívio.

A recusa inicial em assimilar ou digerir o desfecho está intimamente ligada ao propósito do filme: o questionamento da fé e do comportamento humano numa situação de desespero, na qual os valores morais são rapidamente rejeitados e o caos se instala.

Em meio ao fanatismo religioso e ao desespero surge a dúvida: qual seria a verdadeira ameaça? As criaturas monstruosas na neblina ou as pessoas até então ditas civilizadas? Há indícios espalhados por todo o filme que levam ao questionamento da fé, do poder que reside numa crença. Seja a fé religiosa ou a fé na humanidade.

O que presenciamos seria o resultado da descrença, afinal?

A seqüência final deveria entrar para a história do cinema como um dos maiores socos no estômago que já passou ileso pelo “controle de qualidade” dos produtores em Hollywood – aqueles sempre preocupados com o “apelo comercial” das obras. Anticlimática, profundamente triste e frustrante. Mas genial.